Ouvi, certa vez, um conto que dizia sobre a criação de peixes em sistema comunitário. Não sei o quanto dele é verdadeiro, mas que tinha uma foto aérea do lugar dos açudes com a cabeça de um urubu aparecendo na foto, isso tinha.
Esse conto começa com a história de uma comunidade do interior do Ceará que resolveram criar peixes em açudes como forma de ter água, um alimento para a comunidade e, quem sabe, vender um pouco de peixe para trocar por dinheiro que paga as contas.
Não sei se chamaram um técnico de aquacultura ou se ele apareceu por lá para ajudar a organizar o projeto, mas o conto, quem contou, foi o técnico em um curso desses de criação de peixes. Dizia ele:
“- Feito os cálculos para saber quanto que ia custar construir os açudes, comprar os primeiros peixes, ração, redes de pesca, baldes, balanças, puçás……ah….e o salário pelo trabalho de quem trabalhou e o pelo tempo que trabalhou, assim como o descanso de férias…..isso tem que entrar na conta também…”
Escutando esses conselhos, o pessoal começou a achar que ia ser difícil, mas o que é mais difícil do que faltar água?
- Por onde a gente começa? Disse dona Jandira.
- Pelo o que a gente quer? Respondeu o técnico.
- A gente precisa de água. Tião falou.
- Eu sei, mas hoje “tá mais fácil” conseguir o dinheiro pro açude, se a gente disser que vai criar peixe.
- E o dinheiro vem de onde? Alguém perguntou.
- Vem do banco, eu conheço o gerente, posso ir conversar com ele pra ver se libera um dinheiro e a gente vai pagando a medida que vende o peixe.
- “Tá doido, macho?” Pegar dinheiro do banco e ficar devendo sem nunca ter criado peixe! Respondeu seu Raimundo.
Conversa vai e conversa vem, não sei como desenrolou, só sei que no final o pessoal resolveu ir conversar com o tal do “gerente”.
No começo ia todo mundo, mas o “gerente” falava difícil e só o técnico entendia, por fim decidiu-se que só ele ia falar com o “hómi” e depois dizia para o pessoal o que era preciso fazer.
Resumindo o conto, faziam dois anos que a comunidade preparava e entregava documento no banco e nada do “hómi” liberar o dinheiro.
Certo dia, o técnico chegou triste e nem precisou dizer nada, o pessoal já imaginava que o “hómi” tinha pedido algo difícil de conseguir. Desconsolado, ele disse:
- Desisti! Não tem como…..fazem quase três anos e agora ele quer uma foto aérea de onde a gente vai fazer os açudes. (naquela época a internet e as imagens de satélite não eram tão fáceis de acessar).
O silêncio foi triste, mas não demorou muito.
- Aquele bode tá quase morrendo e os urubu já estão de olho. Disse o Tião!
- Tem aquelas redes de pesca que a gente costurou para pescar os peixes, que dá pra pegar um urubu também. Alguém complementou
- Vamos desistir e criar urubu então? Perguntou o técnico.
- Que desistir, “Ma”! Aproveitar que os urubus vão ficar voando em cima e “bora” tirar a foto que o “hómi” quer! Falou o Raimundo
- Não tem o “norteamericano”, amigo seu, que anda pra cima e pra baixo com a máquina fotográfica? “bó” ver se ele empresta. Perguntaram pro técnico.
Parece que o “norteamericano” tinha uma das poucas câmeras que dava pra tirar foto um tempo depois de apertar o botão. Ele topou a ideia e ainda foi ajudar a amarrar a câmera no coitado do urubu, que ainda tinha uma linha amarrada pra não fugir com o objeto raro e importado.
Quando o “hómi” viu a foto, disseram que a cara dele foi engraçada. Gaguejou um pouco e por fim, não se sabe se ele “botou fé” no projeto ou se não tinha mais criatividade e liberou a grana sem pedir “mais nada”……. só o pagamento com os juros do banco.